4 de mai. de 2025

RESENHA: POEMA MOTIVO

 
Por Zuleide Cristiana 
                                                                                                                          

       Cecília Benevides de Carvalho Meireles, foi uma das maiores poetisas da língua portuguesa, nascida em 1901 no Rio de Janeiro, enfrentou desde cedo perdas marcantes, ficando órfã ainda na infância, sendo criada pela avó. Apesar de uma infância solitária, encontrou refúgio na leitura e desenvolveu desde cedo o gosto pela escrita e pelas artes. Formou-se professora em 1918 e se destacou na educação, literatura e música, optando por se dedicar à escrita literária. Em 1919, lançou seu primeiro livro, “Espectros”, e, ao longo da vida, atuou como Poetisa, Pedagoga, Jornalista, Tradutora e Teatróloga. Casou-se com o artista português Fernando Correia Dias, com quem teve três filhas, enfrentando dificuldades financeiras e preconceito social. Em 1934, fundou a primeira biblioteca infantil do Rio de Janeiro e participou de conferências em Portugal. Após o suicídio do marido, continuou contribuindo com a educação e literatura, publicando em 1937 o livro “Viagem”, que a reconheceu e a consagrou como uma das maiores Poetisas da língua portuguesa. Recebeu diversos prêmios, incluindo em 1938 o de 1º Lugar da Academia Brasileira de Letras. Esta resenha enfatiza especialmente o poema “Motivo”, que expressa sua trajetória de perdas e reflete sua profunda sensibilidade, seus dilemas existenciais e a sua superação ao escolher de forma consciente o tornar a dor em arte contribuindo assim, para uma transformação social, marcando sua entrada no Modernismo brasileiro.     
        No poema Motivo, Cecília Meireles expressa uma profunda reflexão sobre a existência, a arte e a transitoriedade da vida. Desde o primeiro verso, ela revela que canta não por euforia ou tristeza, mas porque o momento presente é suficiente. A autora assume sua identidade como poeta, alguém que encontra plenitude no simples fato de viver, transformando dores e alegrias em palavras. 
        Na segunda estrofe, a poeta se identifica com o passageiro, com aquilo que escapa e muda constantemente. Ao dizer que é irmã das "coisas fugidias", ela revela sua habilidade de atravessar o tempo, as emoções e os ciclos da vida com leveza e entrega. Seu caminhar “ao vento” mostra que, como o próprio vento, ela se adapta e segue, mesmo sem controle total sobre o destino. 
        A terceira estrofe traz um tom de incerteza. A poeta assume sua fragilidade diante da instabilidade da vida. Ela não sabe se constrói ou desmorona, se permanece ou se desfaz. Essa hesitação representa a realidade humana: diante dos altos e baixos, somos todos frágeis, inseguros e imprevisíveis. 
        Por fim, Cecília reconhece que seu canto é tudo o que possui. Ele carrega força, vida, pulsação — e é por meio dele que sua existência se eterniza. Mesmo quando o silêncio chegar, e a morte for inevitável, sua arte continuará viva. O poema encerra com um tom sereno, aceitando a finitude da vida, mas reafirmando o poder duradouro da poesia. 
       E esse poema é atemporal, como sua vida foi, pois foi uma existência de vida além do seu tempo, e suas obras produzidas, transformaram a educação, a literatura e a arte em várias nações. E continua ainda repercutindo na vida das pessoas. Suas poesias foram traduzidas em mais de 8 idiomas diferentes, seus poemas musicados por mais de 11 artistas renomados, entre eles: Raimundo Fagner, que não adaptou este poema, mas o gravou em sua íntegra em 1978, 14 anos depois de sua morte. Portanto, depois que ela se calou, sua voz ainda repercute em toda a sua obra. 
         Impressionante é o que uma pessoa pode fazer com suas escolhas e como pode influenciar outras pessoas a fazerem o mesmo, mesmo sem se conhecerem,. A música cantando a poesia, ou a poesia sendo declamada por meio da música? Um artista reconhece outro artista, e este poema é a essência da vida e o que pode ser feito com ela antes que a morte chegue e emudeça tudo. É a voz que fala no silêncio, o relacionamento que nasceu na solidão, e a conquista que veio a partir da perda. Como mensurar o valor da vida representada aqui, que educou crianças, que transformou adultos, e mesmo breve, produziu efeitos que perpassam gerações e leva à reflexão sobre finitude e transcendência: o vem depois que tudo acaba? As obras das mãos, com certeza, pois tornam-se o legado deixado como herança para as gerações vindouras, tornando o artista imortal pela arte que produziu.

MEIRELES, Cecília Benevides De Carvalho. A Viagem: Motivo. 1. ed. Rio de Janeiro: Editorial Império, 1937. 199 p. v. 1.


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